Nos últimos dez anos Rondônia enfrentou diversas crises envolvendo altos representantes políticos, estaduais e municipais, em todos os poderes.
Várias autoridades públicas, de maior e menor escalão, foram investigadas, presas, estão sendo processadas e, algumas, já foram até mesmo condenadas por crimes variados, cometidos no exercício de função pública.
Escândalos sucessivos abalaram a confiança da sociedade rondoniense no poder público, reproduzindo em nossa terra, numa escala quase única, mazelas que são, infelizmente, ainda muito comuns por todo país.
O melhor juízo a respeito do significado dessas crises sucessivas ainda é, contudo, motivo de graves equívocos enraizados na pérfida tradição que insiste em menosprezar as instituições e a sociedade de estados mais distantes dos centros de poder.
Para muitos que pensam dessa forma, Rondônia é apenas um estado menor, fraco e incapaz, formado por pessoas e líderes naturalmente corruptos ou superiormente tendentes para esse comportamento, resultando a conta toda numa condenação ao conjunto da obra, sem expectativa de salvação.
Mas quem, em juízo de sã consciência, defenderá que existam rincões brasileiros tão menos eivados de problemas com a gestão dos negócios públicos, de tal forma que se possam arguir isentos dessas disfunções civilizatórias que oneram e tanto fazem o povo sofrer?
Haverá menos corrupção proporcional aqui ou acolá a tal ponto que esse ou aquele estado mereça a reputação de pureza em termos de moralidade pública?
Em Rondônia, o número de casos de mal feito com o bem público colocados a descoberto nos últimos anos parece apontar, contudo, para outra direção: é de se reconhecer que em nosso estado o correto funcionamento das instituições fiscalizadoras do poder público têm levado a resultados cada vez mais surpreendentes.
Estado jovem e formado pela migração de grupos de todas as regiões do país Rondônia é único em sua identidade múltipla e aberta a inovações.
Apesar dos números ruins em termos gerais de desenvolvimento humano, Rondônia conta com uma sociedade menos estamental e menos enraizada em suas tradições de poder.
Embora a realidade de fragilidade estatal que ainda impera em diversos setores importantes para o bem-estar da população, tem sido possível para polícias, tribunais e órgãos políticos diversos (Câmaras de Vereadores, Assembléia Legislativa e etc) exercerem o mais livremente possível suas tarefas duríssimas de zelo pelo que é de todos.
Toda democracia somente subsiste por meio de conflitos devidamente regulados pelo direito.
Mesmo Maquiavel afirmou em seu “Discorsi” preferir o sistema republicano romano por permitir, por meio dos conflitos regulados, um equilíbrio social que poderia conduzir à estabilidade e à paz.
Não há que se esperar de nenhuma democracia um conto de fadas. Instituições e grupos sociais em Rondônia passam por um cenário de intensificação de relações que será positiva para o cidadão comum, o qual sabe, cada vez mais, o que se passa em torno das mesas decisórias – podendo assim exercer um juízo mais consciente quando da escolha de novos representantes políticos.
Afirmações levianas de que em Rondônia as mazelas cometidas contra o bem público sejam incomparáveis escondem o fato de que por essas plagas a impunidade não campeia, não domina, não se impõe sem resistência.
Os processos que levaram políticos rondonienses a condenações inéditas na Corte Suprema tiveram início aqui, por meio de investigações comandadas por autoridades federais ou estaduais atuando a partir das estruturas montadas em Rondônia. O sistema acusatório e o sistema de defesa aqui tiveram ampla liberdade até a busca dos resultados finais.
Nesse universo de profundas transformações por que passa nosso Estado o Ministério Público Estadual sem dúvida foi uma das instituições que mais cresceu e a que mais prestou contas diante da população de suas atribuições.
Alvo de achincalhes anônimos publicados em panfleto sorrateiro há poucos dias, o chefe maior da instituição, Héverton Aguiar, segue ileso capitaneando esforços para que o combate a corrupção não esmoreça.
A OAB, instituição única, representante qualificada e destemida da sociedade civil na arquitetura constitucional brasileira também vem passando por grandes mudanças em Rondônia.
A OAB/RO reassume seu lugar e volta ao centro das discussões e processos decisórios, buscando fazer jus ao mandato conferido pela sociedade para exigir a construção de um estado decente, respeitador dos direitos fundamentais das pessoas e probo no exercício da autoridade.
Em Rondônia não se vive o caos. Se as respostas ainda não têm sido as mais eficazes para os justos anseios populares a inquietudade que ronda os gabinetes é prova de que aqui é melhor que a autoridade não relaxe seus passos no caminhar dentro da lei.
Estamos todos construindo um lugar melhor para viver. Inadmissível aceitar a pecha de que somos um rincão maldito perdido no dorso de um gigante que avança. Enquanto a impunidade campear nas searas mais centrais dos planaltos brasileiros, não se pode acusar nosso Estado de seguir o mal exemplo.
Andrey Cavalcante
Presidente da OAB-RO