A proposta de redução da maioridade penal, contra a qual a OAB se posicionou desde o início dos debates foi derrotada na Câmara por cinco votos. O placar registrou 303 votos a favor e 184 contra, quando seriam necessários 308 votos favoráveis para a aprovação da emenda constitucional. Mas os parlamentares, lamentavelmente, passaram longe da necessária preocupação com a gravidade da situação da segurança pública no país, com o crescente consumo de drogas, criminalidade e violência dos jovens. Nem com a impunidade que aduba, ela sim, tudo isso. Nem com a histórica omissão do governo e da própria sociedade em relação ao problema.
A redução da maioridade teria que ser reprovada não por razões ideológicas, mas por contrariar cláusula pétrea da Constituição, “garantia fundamental inerente ao indivíduo, posta na Carta Constitucional como valor insuprimível. É cláusula pétrea, imune a qualquer proposta de reforma tendente a aboli-la”, como esclareceu o presidente nacional da OAB, Marcos Vinicius Furtado Coêlho em bem fundamentado artigo publicado em “O Estado de São Paulo”.
Mas, também, por tangenciar a questão, conforme já dissemos aqui em artigos anteriores. O problema reside na falta de certeza do castigo. Essa seria a bandeira correta a ser levantada. A solução da criminalidade exige educação de qualidade em período integral, para todos, prevenção e certeza do castigo previsto na lei. Esse é o caminho correto. Mas nada disso se faz no Brasil, que teima em seguir o errado.
A sociedade clama – e o surpreendente crescimento da chamada “bancada da bala” comprova isso – por uma solução para o problema da insegurança. E se revolta ao acompanhar a barbárie praticada por menores no noticiário da imprensa. Daí aceitar a ideia de que é preciso trancafiar os menores. Mas a realidade demonstra que, a não ser por alguns casos mais dramáticos e de forte apelo midiático, eles não seriam presos, ainda que fosse aprovada e vigesse a redução da maioridade penal. Simplesmente porque a polícia brasileira está sucateada e não apura nem 8% dos crimes, o que assegura impunidade prévia para os demais 92%, sejam eles praticados por menores ou adultos que, aliás, são maioria. Ou seja: “A redução da maioridade penal como solução de um problema social é a exploração do humano de consciência ingênua pelo humano demagogo”, como esclareceu o professor Luiz Flávio Gomes.
A redução da maioridade penal teria realmente que ser derrotada por ser ineficaz, inconstitucional e inócua. Por ser uma tentativa de passar ao público a ilusão de que algo de efetivo está sendo feito para o combate à criminalidade. Como esperar, afinal, que a lei possa punir os menores com a lei dos adultos, quando ela não os alcança? O que nossos parlamentares deveriam fazer, de fato, seria parar com essa pantomima, de apregoar a ilusão de que estão trabalhando para a busca das soluções e abordar com seriedade a questão. A derrota do projeto de redução da maioridade penal não é para ser comemorada, mas também não merece ser lamentada. Ela não deveria nem mesmo ter sido levada a plenário, de forma a poupar os parlamentares para tarefas mais ingentes e de abundante demanda congressual.
Há que se começar por aproveitar o momento e promover um amplo debate sobre a questão, de forma a mobilizar toda a sociedade em busca de soluções práticas, possíveis e realizáveis, considerada a penúria da realidade nacional. Sem vitimização e demagogia. É possível, por exemplo, mudar o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA – conforme propõe o projeto de lei do senador José Serra, que eleva o tempo máximo de internação do menor infrator de três para dez anos. Está, portanto, bastante claro que a maioridade penal não é a dificuldade a ser superada, como escreveu em seu artigo o presidente nacional da Ordem: “O índice de reincidência entre os menores internados é um terço da reincidência entre os presos nas penitenciárias brasileiras. O percentual de adolescentes com 14 e 15 anos já chega a 40% dos internados. Todos estes dados evidenciam que a redução da maioridade para 16 anos não será uma aliada da sociedade no combate à violência. Não podemos perder nossos jovens para o crime. Devemos acolhê-los, não encarcerá-los”.
Andrey Cavalcante, presidente da OAB Rondônia