Nos dias atuais de intensa mobilização no combate à corrupção e na defesa da moralidade, não é demais lembrar o compromisso da advocacia com a liberdade de expressão e as garantias individuais, aí compreendendo os sagrados direito à defesa, ao contraditório e à presunção da inocência, sem os quais não haverá justiça.
Ainda assim, ainda não está livre o advogado da incompreensão de alguns quando está em discussão o dispositivo constitucional de que a inocência é, obrigatoriamente, presumida, até a decisão condenatória transitada em julgado. Vivemos tempos estranhos, e neste ponto recorro a uma frase repetida diante de situações em que tribunais admitem acusações genéricas e anônimas, aceitam provas pelo valor dos seus resultados, sem questionar como foram obtidas, prisões provisórias e temporárias são decretadas irrefletidamente e a quebra de sigilos tornou-se de aplicação corriqueira.
Recentemente, da boca de um desembargador (Paulo Espírito Santo, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região) saiu uma frase lapidar, típica da euforia condenatória – condenar de qualquer modo, condenar sempre – que passou a dominar os espíritos togados: “Eu perdoo o advogado que vem aqui defender clientes; essa é a função do advogado e a gente tem que perdoar.”
Creio que escapou ao desembargador a lembrança de que, no Brasil, a advocacia tem status constitucional de profissão indispensável à administração da Justiça e o advogado é responsável por zelar pela honra, a liberdade e o patrimônio das pessoas, indistintamente. Ou, na pior hipótese, quem sabe o desembargador faltou a esta aula.
Crimes e criminosos devem ser punidos, nos termos da lei, mas o direito de defesa é sagrado, assim reza o compromisso que o advogado jurou honrar até o fim. O que se defende é a pessoa humana, não o criminoso. Defende-se o presumido pecador, e não o pecado, para se fazer cumprir o preceito constitucional do devido processo legal e que se obtenha uma sentença justa. Mas acusar é sempre mais fácil do que defender, principalmente em países nos quais as injustiças sociais são profundas.
Histórias como estas servem para mostrar os espinhos dos quais o advogado precisa se desviar no exercício da profissão. Muitas vezes, a defesa da boa aplicação da justiça lhe custa diferentes formas de pressão, desde a coação psicológica até ameaças à integridade física.
O sucesso de um advogado só lhe chega depois de muito esforço. Na maior parte dos casos, o trabalho começa cedo e se estica até tarde da noite, com idas e vindas aos fóruns, construção de teses jurídicas, esperas – às vezes, intermináveis – em antessalas de juízes, audiências, telefonemas. E o mais importante fator: o cliente, que entende pouco os mecanismos e a lentidão do nosso sistema judicial e os pressiona a conseguir os melhores resultados no mais breve espaço de tempo.
Por tudo isso a advocacia merece ser homenageada neste 11 de agosto, que lembra o calendário ser a data na qual foram formalmente instituídos os primeiros cursos jurídicos no país, em São Paulo e Olinda, no longínquo ano de 1827. Foram eles o embrião de uma profissão que, penso eu, deve ser exercida por pessoas de espírito jovem, repletas de sonhos, não importa a data de nascimento que consta na carteira de identidade.
Porém, mais do que apenas juventude na alma, o advogado deve ter coragem. Sem coragem, um advogado será incapaz de fazer justiça. E sem justiça não existe sociedade civilizada. Ditadores, imperadores, tiranos e pessoas autoritárias de forma geral miram, sempre, os advogados como seus principais desafetos. E tentam calar a sua voz, das maneiras mais vis e dissimuladas quando seus interesses são contrariados. Por quê? Porque o advogado é a antítese do abuso de poder.