Não se pode negar, hodiernamente, o fundamental papel dos Advogados da União e dos Procuradores dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios como verdadeiros Defensores dos Interesses Públicos Primários e Secundários, os quais, consoante valoroso ensinamento de Celso Antônio Bandeira de Mello, coincidem com a realização de políticas públicas voltadas para o bem estar social, satisfazendo o interesse da sociedade, do todo social, de um lado e permitindo ao Ente Estatal também a defesa de interesses patrimoniais, de outro (cfr. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Editora Malheiros, 22ª Edição, 2007, p.550).
Esse tratamento está edificado no texto normativo de nossa Lei Maior, notadamente no artigo 132 da Constituição Federal, que assim dispõe:
Art. 132. Os Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, organizados em carreira, na qual o ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica das respectivas unidades federadas.
Logo, não restam dúvidas, inclusive do ponto de vista Constitucional, acerca da importância da Advocacia Pública para a Sociedade Brasileira, em defesa do Erário. Relevante papel também desempenham as Procuradorias no assim chamado Controle de Juridicidade dos atos administrativos, controle este consistente na adequação dos atos emanados pela Administração aos que dispõem normativamente a Constituição Federal e toda a legislação infraconstitucional aplicável a cada caso concreto. Isso significa afirmar que Controle de Juridicidade implica no Controle de Legalidade somado ao Controle de Constitucionalidade dos atos administrativos.
Entre as muitas atividades do dia a dia dos Advogados Públicos, podemos destacar a emissão de pareceres (consultoria de gestores públicos), a revisão de contratos e de atos de gestão, a revisão normativa, a fiscalização de contratos e de convênios, como atividade consultiva, além do ajuizamento de execuções fiscais, de ações de ressarcimento, a ativa participação em ações civis públicas e de improbidade administrativa, além de outros feitos judicias de variadas naturezas (trabalhistas, fiscais, administrativos) que representam interesse dos Estados, participando ativamente em audiências, representando a Administração Pública dentro e fora da Comarca, em reuniões ou outros atos necessários ao desempenho de suas regulares atribuições constitucionais e legais.
Assim, em época de forte crise econômica e institucional, nota-se, em nosso País, uma crescente valorização da Advocacia Pública, por boa parte dos Gestores Públicos Brasileiros, os quais conseguem enxergar que o fortalecimento das Procuradorias como Instituições Democráticas implicará significativa economia de recursos públicos, dando à Sociedade e ao Administrador a segurança jurídica necessária para a realização das políticas públicas de que a População tanto necessita.
Outras medidas igualmente importantes e necessárias, entretanto, ainda estão pendentes de serem reconhecidas e implementadas pela Administração Pública, como forma de fortalecer, ainda mais, as carreiras da Advocacia Pública.
Uma delas é a supressão do sistema rígido de controle de horário (por meio de folha de ponto) dos Procuradores. A instituição de controle de horário apequena a função do advogado público, promovendo apenas e tão somente sua submissão à Administração, situação que compromete, sensivelmente, sua autonomia e independência garantidas pela Constituição Federal e por Legislações Específicas, como a norma do artigo 1º da Lei Complementar nº 620, de 20 de junho de 2011 (Lei Orgânica da Procuradoria Geral do Estado de Rondônia).
Não se pode negar que a submissão de Advogados Públicos a uma jornada rígida de trabalho, com controle de ponto, lhes subtrai parcela significativa das condições apropriadas para o exercício pleno da função, em desacordo com o disposto no §1º, do art. 31, da Lei 8.906, de 1994 (Estatuto da Advocacia), que assim dispõe:
Art. 31. O advogado deve proceder de forma que o torne merecedor de respeito e que contribua para o prestígio da classe e da advocacia.
(…) § 1º O advogado, no exercício da profissão, deve manter independência em qualquer circunstância.
A obrigatoriedade de preenchimento manual ou eletrônico de folha de ponto destoa da realidade acerca da atuação do exercício da Advocacia, mesmo a Advocacia Pública, especialmente nos dias atuais, em que se exige muito do Procurador, com significativas mudanças na legislação vigente nesse sentido, a exemplo da regulamentação do processo judicial eletrônico (CPC/2015, artigos 193/199), bem como a admissão do trabalho à distância para fins de configuração da relação de emprego (art. 6º, da CLT).
A independência funcional dos membros da Advocacia Pública encontra guarida no artigo 132 da Constituição Federal e em normas expressas que regulamentam cada uma dessas carreiras, como o já mencionado artigo 1º da Lei Complementar nº 620, de 20 de junho de 2011, diante da natureza dos trabalhos inerentes ao cargo.
Também o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB) vem implementando uma diretriz de defesa das prerrogativas da Advocacia Pública, elaborando súmulas específicas de proteção dos direitos dessa Classe de Advogados.
A Súmula 10, de forma genérica, estende aos Advogados Públicos todos os direitos e prerrogativas insertos no Estatuto da OAB.
Já a desnecessidade de preenchimento e encaminhamento de folha de ponto por procuradores encontra guarida específica em verbete próprio, in verbis:
Súmula 09 – O controle de ponto é incompatível com as atividades do Advogado Público, cuja atividade intelectual exige flexibilidade de horário.
Desse modo, há de ser reconhecida a dispensa do controle de ponto aos Advogados Públicos, na medida em, de um lado, desempenham atividades que exigem o deslocamento para fora da sede de sua repartição e, de outro, a lei atribui aos advogados públicos responsabilidade pessoal pelos atos que praticarem ou deixarem de praticar, de modo que tais profissionais tem a prerrogativa de utilizarem todo o tempo necessário e escolherem o local que entenderem mais adequado para pesquisar e praticar os atos jurídicos na defesa do interesse público.
Vale dizer, o Procurador deve estar disponível o tempo todo para cumprir suas tarefas dentro do prazo legal, sob pena de responsabilização, independentemente do término ou não de sua jornada de trabalho.
Nesse diapasão, é pacífico o entendimento jurisprudencial sobre a impropriedade em fixar controle de jornada aos advogados públicos, circunstância que implica flagrante violação ao livre exercício profissional e às prerrogativas próprias da advocacia, confiram-se:
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR. PROCURADOR AUTÁRQUICO. CONTROLE ELETRÔNICO DE PONTO. DECRETOS 1.590/95 E 1867/86.
1. A instituição de controle eletrônico de ponto para procuradores, por óbvio, não se compatibiliza com o exercício da atividade voltado para a advocacia.
2. O exercício da advocacia tem como pressuposto a maleabilidade. Neste contexto, a submissão dos procuradores a ponto eletrônico de frequência desnatura a singularidade do ofício e promove restrição indevida da atuação do profissional.
3. Os Decretos 1.590/95 e 1867/86 bem dispõem sobre diversa forma de controle de frequência para os servidores que exercem suas atividades em ambiente externo.
4. Apelação e remessa oficial improvidas.
(PROC. 2000.03.99.065341-7 AMS 208655 – ORIG.: 9800170030 9 Vr SÃO PAULO/SP – Relator Juiz Federal convocado Paulo Sarno / Segunda Turma / TRF 3ª Região)
MANDADO DE SEGURANÇA. PROCURADOR AUTÁRQUICO. CONTROLE DE FREQUÊNCIA. ‘PONTO ELETRÔNICO’. INSUBMISSÃO. PROCEDÊNCIA.
As atividades peculiares dos procuradores autárquicos, como o deslocamento para fora da sede de sua repartição, a militar nos foros, afastam a exigibilidade do controle eletrônico de frequência (…)”.
(Tribunal Regional Federal da 5ª Região, cf. AMS n°. 67643-SE, Relator Desembargador Federal UBALDO ATAÍDE CAVALCANTE
Assim, os Advogados da União e os Procuradores dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios desempenham papel social relevante em Defesa da Sociedade e do Erário, merecendo valorização e tratamento diferenciado no que diz respeito à necessária observância da autonomia e independência funcional.