Estamos vivenciando uma crise, sem precedentes, no sistema prisional e socioeducativo em todo o Brasil. Rondônia não fica fora dessas terríveis estatísticas, pois já ocorreram dezenas de mortes em várias unidades de privação de liberdade do Estado, onde, em tese, deveria haver proteção e oportunidades para superação; todavia, o que vemos são seres humanos desprotegidos digladiando-se, torturando-se e exterminando-se dentro das desumanas celas sórdidas, fétidas e tenebrosas.
Mesmo após o Estado brasileiro ter assinado o “Pacto para Melhoria do Sistema Prisional do Estado de Rondônia”, outorgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos no ano de 2011, devido às aterrorizantes mortes de 27 (vinte e sete) detentos da Casa de Detenção Dr. José Mário Alves (Urso Branco). Ainda assim, dezenas de vidas continuam sendo ceifadas, de forma cruel, em várias unidades prisionais e socioeducativas em todo o Estado, chegando ao número aproximado de 50 (cinquenta) mortos, até junho do corrente ano.
Não temos como falar em melhorias do sistema prisional e socioeducativo em Rondônia, conforme propõe o “Pacto”, enquanto as medidas efetivadas continuarem paliativas, emergenciais e somente quando ocorrem tragédias com grandes proporções, aonde, perdem-se muitas vidas. Os comentários não passam de algumas poucas reportagens, vazias e sem emoção, banalizando-se a vida humana. Notícias fadadas ao esquecimento da maioria da população, exceto dos filhos que se tornaram órfãos, das esposas viúvas e das inúmeras mães inconsoláveis, cada qual chorando sobre o túmulo do filho que não nasceu “bandido”. Repetindo-se o ciclo da desigualdade social: o Estado terá mais órfãos, viúvas e mães solitárias, cuja esperança da superação, apagou-se de seus corações torturados pela dor da perda.
A recente tragédia ocorrida no “Centro Socioeducativo Lar do Garoto”, em Lagoa Seca, região metropolitana de Campina Grande (PB), que deixou 07 (sete) mortos; cuja unidade de internação teria a capacidade para 44 (quarenta e quatro), todavia entulhavam 218 (duzentos e dezoito) internos, coisificou seres humanos, negando-lhes a prerrogativa de sujeito de direitos. Tornou-se, a referida tragédia, uma amostra real que a Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente) e Lei 12.594/2012 (SINASE), não têm sido efetivadas. Ao que parece, as referidas normas, não teriam sido lidas, ou caso tenham sido, foram, completamente, ignoradas pelos gestores públicos e pelas autoridades judiciárias, as quais têm obrigação de fazê-las cumprir, e não as fizeram.
O Estado de Rondônia tem hoje 218 (duzentos e dezoito) adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de internação, vivendo em unidades socioecucativas, que nada têm haver com o nome, pois não educa e nem busca a ressocialização desses seres humanos em situação peculiar de desenvolvimento. Sem falar que, essas unidades em sua maioria, são ambientes interditados pela justiça, devido à insalubridade e alta periculosidade do local para o adolescente e o socioeducador.
O Estado busca melhorar o sistema com a implantação forçada das unidades regionalizadas, entretanto, essas acabam violando o artigo 32 do SINASE (Lei 12.594/2012), pois retira o adolescente da convivência familiar, pelo que impossibilita, ainda mais, a sua ressocialização e reintegração familiar; a qual é a forma mais efetiva, provada por especialistas, de se impedir o crescimento da marginalidade ainda na fase da adolescência, em que o ser humano está em situação peculiar de desenvolvimento.
Não podemos ser indiferentes, ou ficar inertes à realidade que ocorre no país e em nosso Estado de Rondônia. Devemos, em ação articulada, com a sociedade civil, o executivo, legislativo, judiciário e membros do jornalismo, traçarmos estratégias, que transformem essa aterrorizante realidade, a qual vem levando nossos adolescentes ao extermínio. O país e o Estado que não cuida de seus jovens cidadãos, definitivamente, não terá um bom futuro, além de estar cometendo crime, por violar os tratados internacionais de Direitos Humanos. Ou se ganha os adolescentes, ou perde-se o país.
Esequiel Roque do Espírito Santo é presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos da OAB Rondônia