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Artigo: Equilíbrio da Justiça, por Andrey Cavalcante

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O que teriam em comum o procurador federal Deltan Dalagnol e João Pedro Stedile, na pauta dos encontros que mantiveram, no mesmo dia, com o presidente da OAB Nacional, Felipe Santa Cruz? “Nada” seria a resposta correta, correto?  Errado. Ambos foram defender e – claro – buscar apoio para visões particulares do direito e da aplicação da lei. Ambos são claramente a favor de valer-se dos fins para justificar os meios. O primeiro acredita em um verdadeiro “vale-tudo” em nome da luta contra a corrupção. O outro parece convencido de que uma controversa “função social da terra” legitima inclusive afrontas à constituição e às leis.

Felipe Santa Cruz ilustrou, com o relato, o encerramento da excelente entrevista concedida à jornalista Ana Pompeu, do site Consultor Jurídico – Conjur, cuja leitura recomendo. Não apenas aos advogados, mas a todas as autoridades civis e militares, aí incluídos os setores políticos e eclesiásticos. Ou seja: a todos os tenham responsabilidade e compromisso com a sociedade e possam contribuir para a necessária correção dos rumos da preocupante realidade nacional. O presidente da Ordem demonstra ser possível, sim, tratar com dignidade mesmo aqueles a cujos propósitos irá combater sem trégua no Judiciário, mas aos quais jamais irá admitir que seja negado o direito à Justiça.

Ele disseca, com serena habilidade, a anatomia conjuntural brasileira para apontar os inúmeros pontos de cavitação que comprometem todo o organismo para instalar, pelo radicalismo, pelo medo, pela insegurança, pela insídia e pelo oportunismo, o atual ambiente institucional insalubre da vida nacional. E não deixa dúvidas sobre o comprometimento do equilíbrio pendular da justiça, provocado pelo furioso ataque ao direito de defesa, que acaba por também prejudicar o combate à impunidade. Felipe Santa Cruz chama a atenção para o fenômeno da financeirização do debate em questões que invariavelmente resultam no comprometimento dos direitos sociais. E, pior, que obtenham apoio de uma população frustrada pela crise econômica. Todo o processo histórico que resultou nas conquistas da constituição de 88 é desprezado, por uma situação conjuntural. Lamenta-se que parcelas da sociedade, somente incluídas graças à democracia, estejam a condená-la.

Deltan Martinazzo Dalagnol pretendia obter apoio da OAB para a fundação que o Ministério Público de Curitiba pensou em criar com recursos das multas aplicadas à Petrobrás. “Nós nos opusemos — estamos, inclusive, com um amicus curiae no Supremo sobre essa matéria” — esclareceu. João Pedro Stedile procurou a OAB para defender a desapropriação unilateral da fazenda de João de Deus.  “Estranhei que os dois tinham pautas parecidas: um Ministério Público muito radicalizado na persecução e o MST interessado na desapropriação unilateral da fazenda do João de Deus para fins de reforma agrária, sem obediência ao devido processo legal – direito que acredito ser devido também aos acusados em Curitiba. Por terríveis que tenham sido seus casos, desvios milionários do dinheiro do povo brasileiro, merecem também o devido processo legal. É Isso o que nos une, que faz da nossa uma sociedade democrática, uma civilização”.

A prevalência do financeiro sobre o social no debate sobre as reformas poderá até encontrar apoio no anseio da população pela superação das dificuldades econômicas. Mas haverá de encontrar uma posição inclusive contramajoritária da OAB, na consciência da necessária preservação de conquistas históricas. Como na reforma trabalhista, que sacrificou o manto protetor da Justiça do Trabalho para os mais pobres – houve mudanças até em questões sobre lactantes e grávidas – pela expectativa de uma geração de empregos que não se confirmou. Na reforma da Previdência, o governo fala de economia de R$ 1 trilhão, o que é bom. Mas não se pode esquecer dos direitos ao benefício de prestação continuada, do atendimento ao deficiente, da aposentadoria rural. Tudo isso deve ser inserido no debate. “Cabe à OAB lembrar que ali estão envolvidos direitos e, em especial, direitos de populações vulneráveis economicamente. É esse debate que nós, da área jurídica, temos que recuperar. Recuperar a nossa capacidade de comunicar o que o Direito busca proteger e quanto custou para ele ser construído”.

– “Eu tenho sido procurado cotidianamente por todas as forças da sociedade. Professores universitários, jovens, setores religiosos, todos preocupados com uma série de declarações que são dadas, que trazem certa instabilidade, insegurança ao quadro institucional brasileiro. É só contenção, porque todos nós concordamos que o momento do Brasil não é um momento positivo, principalmente para os mais pobres. Vamos concordar com o que tivermos que concordar, fazendo os nossos ajustes no aspecto técnico, pedagógico, lembrando às instituições a origem de determinados instrumentos. Quando eu digo que nós não somos da esfera da política, significa que a nossa oposição também será técnica, de contribuição jurídica. Nós não somos um partido de oposição. Nem de situação. Essa é a forma que a Ordem tem de servir o país nesse momento”.  A OAB jamais se afastou de seu histórico compromisso com o estado democrático.

Fonte da Notícia: Andrey Cavalcante - Conselheiro Federal

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