Chico Buarque, em uma música de 1978, cantada na peça Ópera do Malandro, retratou a sua personagem Geni, um travesti que era apaixonado pelo cafetão Duran e era por ele explorado, tão bem descrita na música Geni e o Zepelim, que tinha como grandes qualidades: “Joga pedra na Geni! Joga bosta na Geni! Ela é feita pra apanhar! Ela é boa de cuspir! Ela dá pra qualquer um! Maldita Geni!”.
Esta parte da importante peça teatral de Buarque, trata da figura de Geni e como esta é vilipendiada diuturnamente por todos, mas que as vezes é a solução dos problemas, é lembrada e cultuada, para depois voltar a ser boa para “jogar pedra e para cuspir”.
Durante a música, Geni é descrita como esta personagem que é agredida e ofendida com frequência, mas que ao necessitarem dela, em decorrência de um possível ataque de um zepelim e que o seu comandante descreveu que não atacaria a cidade se ela lhe servisse, foi louvada, elogiada, agraciada com louros e colocada como a salvação daquela sociedade, quando lhe pediram para ceder aos encantos daquele ofensor e evitar o ataque.
Geni, então, cede aos clamores realizados pela sua cidade e “se entregou a tal amante,
como quem dá-se ao carrasco”. Após salvar a cidade, ao se deitar com o forasteiro, acabou novamente a ser ‘louvada’ por todos pelo seu ato, quando cantaram novamente em uníssono: “Joga pedra na Geni! Joga bosta na Geni! Ela é feita pra apanhar! Ela é boa de cuspir! Ela dá pra qualquer um! Maldita Geni!”.
Esta fala tem como objetivo se interseccionada com o dia de hoje, que é Dia do Professor, já que, como professor, vejo o quanto somos tratados cotidianamente como a Geni. Explico-me!
Os professores têm sofrido muitos ataques e desvalorizações de nossa classe política, de nossa sociedade civil, organizada ou não, de alunos e pais, de nosso governo, dentre outros tantos que nos ofendem corriqueiramente, pagando baixos salários, dando-nos péssimas condições de ensino, procedendo a perseguição contra tudo que lhes apresentamos que seja dispare do que pensam ou quando queremos levá-los a grandes discussões, saindo da habitual aula ‘mastigadinha’, ‘facilitada’ e ‘esquematizada’.
Querem nos impedir de proceder a discussão dos grandes temas que assolam a nossa sociedade, nosso mundo e o espaço em que vivemos; querem nos vilipendiar nossa conduta de proceder o debate sobre certas ‘questões morais’ que ofendem a ética pública da sociedade em que estamos inseridos; querem que descrevamos um ensino onde seja pregando valores e fatos que não ocorreram da forma que são postos; querem jogar pedra por estabelecermos a propagação de uma cultura de Direitos humanos e de compreensão dos mais distintos aspectos da nossa humanidade; querem nos cuspir por levar nos discentes a debater as atualidades que estão presentes no mundo em que nos entrepomos; querem nos fazer apanhar por lutar por nossos direitos ou pelos direitos de toda a sociedade; querem que demos para que para qualquer um, para que possamos nos submeter aos interesses e desígnios alguns políticos, na implementação de políticas, no mínimo, duvidosas para a educação.
Quem realiza este tipo de proceder se esquece do caráter libertador, esclarecedor, emancipador, empreendedor e transformador que a educação tem e que é o professor que pode levar o aluno a este processo de iluminação. Mas tais atos não podem se estabelecer somente por via de um processo clássico de ensino, que não mais dá resultados, ao não permitir que o professor acesse os mesmos instrumentos que são de tanto interesse dos seus alunos fora de aula.
O professor tem que permitir ao seu aluno encontrar o esclarecimento, a conhecer o mundo a sua volta, para que este possa proceder as mudanças que tanto necessitamos. Ou seja, o mestre não deve ser mais um a fazer do seu aluno ‘mais um tijolo no muro’, já que esta não é a sua função.
Embora tudo isso, hoje é Dia do professor, mas mesmo com tantas dificuldades, com tantos empecilhos a proceder uma educação que abra os horizontes, ainda há o que se comemorar. O quê? Você poderia me perguntar.
Eu lhe digo, comemorar que somente com a educação é que mudaremos este mundo; que somente com ela teremos menos ‘Genis’ em nossa sociedade; e que neste processo de transformação, as pedras e cuspes lançados serão cada vez mais escassos; por que o professor não educa para o hoje, ele participa do processo para permitir que o seu aluno se transforme e com esta transformação mudemos a nossa sociedade.
Mas isso não é muito utópico? Pode ser, mas crer no poder da educação é crer em algo palpável que liberta e retira a opressão, que é a disseminação do conhecimento.
Apesar de tudo, um grande Dia dos Professores para todos, que como eu acreditam no poder da educação de “criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção”.
Walter Gustavo Lemos é presidente da Comissão de Ensino Jurídico da OAB/RO.