A credibilidade da luta contra a corrupção fica ameaçada pelo sigilo imposto pela presidente do Supremo Tribunal Federal às 77 delações que homologou de executivos da Odebrecht. O cidadão não aceita mais o convívio com a ocultação das ações judiciais relacionadas aos crimes praticados contra o erário, que repercutem em efeitos perversos na mesa de cada família. Pode até ser que alguns inocentes – espero sinceramente que sejam muitos, para benefício da dignidade pátria – sejam injustamente acusados. Mas é até justificável certa dosagem de sacrifícios em favor do resgate da moralidade nacional.
Não custa lembrar que a realidade ensina serem aplicadas com exclusividade sobre a população as cotas de sacrifícios pela recuperação do País. Nesse sentido é, então, plenamente justificável e oportuna a manifestação do presidente nacional da OAB, Cláudio Lamachia, que distribuiu nota à imprensa para declarar que é preciso que fique “bastante claro” para a sociedade brasileira o “papel de cada um dos envolvidos” no esquema de corrupção, independentemente de eles integrarem os quadros da iniciativa privada ou serem agentes públicos. “Nessas horas, a luz do sol é o melhor detergente”.
A homologação das delações da Odebrecht insere-se no empenho da ministra Cármen Lúcia para assegurar que a escolha do novo relator da Lava Jato esteja em plena sintonia com a lei e o regimento interno da Suprema Corte, além de não ferir eventuais suscetibilidades dos outros ministros. Certamente a ministra tem em mãos uma tarefa delicada, a exigir apurado equilíbrio entre o necessário exercício da autoridade que lhe confere a presidência do STF e o igualmente necessário respeito à colegialidade do Supremo. Talvez por essa circunstância a ministra Cármen Lúcia tenha optado por não levantar o sigilo das delações, não atraindo a si desnecessários holofotes, especialmente em momentos tão sensíveis como o atual – diz, em editorial, o jornal O Estado de São Paulo.
Mas há que se considerar que para evitar constrangimentos pessoais a ministra acaba por distribuí-los aos magotes por toda a classe política já que era norma geral o recebimento de doações eleitorais de empresas antes da ação da OAB que resultou na proibição pelo próprio STF. Não importam eventuais doses de prejuízos ou benefícios que possam advir para o governo da quebra do sigilo. Mas a verdade é que sua manutenção vai estimular os recorrentes vazamentos seletivos, que tumultuam ainda mais a já conturbada vida política da nação, comprometem a operacionalização da administração pública e, de resto, fazem a festa dos especuladores.
Claudio Lamachia cobrou do Supremo Tribunal Federal o afastamento do sigilo que cerca os depoimentos de 77 delatores da Odebrecht, executivos e ex-funcionários ligados à empreiteira. Ele louvou a decisão da ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo, que homologou a maior delação da Operação Lava Jato, mas não levantou o segredo sobre ela. E classificou a decisão não apenas como um ato de justiça à memória do ministro Teori Zavascki: é também uma garantia à sociedade de que o julgamento da Lava Jato não será interrompido ou mesmo atrasado, para benefício de corruptos e corruptores. “Todos devem ser julgados com o rigor da lei, tendo preservados o amplo direito de defesa, mas não podemos aceitar que haja uma interrupção que favoreça quem tanto mal fez ao Brasil”.
Na opinião sempre ponderada do jornalista e membro da Academia Brasileira de Letras, Merval Pereira, parece consenso na opinião pública elas devem ser tornadas públicas. Pela lei, os depoimentos das delações premiadas são liberados apenas no final do processo, e apenas quando o Ministério Público considera que as investigações levantaram provas suficientes para que abra um processo contra alguém delatado ou peça permissão ao Supremo caso o delatado tenha foro privilegiado. Mas cabe ao relator do processo a prerrogativa de liberá-los, caso considere importante para o interesse público. O substituto de Teori Zavascki terá essa possibilidade.