Há silêncios ensurdecedores.
Quando descobrimos que nem sempre podemos nos servir da justiça a qual servimos? Que ela, muitas vezes, esquece que existimos. Quando nos omitimos?
O cerne da questão tornou-se a junção de dois termos. Estupro culposo. O crime, sendo ou não cometido, ficou em segundo plano. Ineditismo? A dignidade humana sendo posta à prova, sob pena da inexistência de provas processuais. Somos iguais. Não nos esquivemos do que sabemos ser o certo, sob o pretexto de termos amorais.
O resultado não justifica o cenário. Como um filme de horror, não podemos acreditar que deveríamos estar preparados. As marcas que ficam para toda a vida instauradas, reveladas, feridas, devem doer em todos nós, e não apenas em quem as recebe na pele. Sempre serão sentidas. O exemplo do desserviço, enquanto pedimos solenemente que tantas outras não se calem. Cartazes coerentes demandam atitudes equivalentes.
Em um palco em que só há espaço para amadores e culpa, já não existimos. Quando vítima assume papel no banco dos réus, em uma repulsiva conjuntura, provoca-nos, revolta e apelo de consciência. respeito, consequências. Mulheres que lutam diariamente. Como nos tornamos figurantes nos nossos próprios destinos?
Acusadas do não domínio dos nossos instintos. Tentativas para calar a nossa voz, nunca parecem depor a favor de nós. Já que quando somos vítimas, nos vitimizamos. Quando autoras, julgadas livremente. Só mulheres não se enganam – sempre conscientes. E quando acusadas, devemos aceitar passivamente? Independentes. Condenadas até por nossos equivalentes. A sociedade não está preparada para respeitar naturalmente? Para amparar o benefício da dúvida se ele estiver de salto alto, tênis, chinelo, descalço, exercendo direitos fundamentais? Ir, vir, consentimentos, horários. Culpabilizamos da maneira mais fácil, para que não seja tão difícil de explicar o inexplicável. O que estamos admitindo? O que estamos aceitando? Regredimos na medida em que nos capacitamos? Aonde vamos?
Baseados na Constituição, estão os princípios da Advocacia, nobre profissão que escolhi por vocação. Todos temos direito à defesa, sob qualquer acusação. Mas, a forma com que desenvolvemos nosso julgamento, diz mais sobre nós do que nossa opinião. Acima das provas e dos papeis, está o ser humano. Denúncias não deveriam se tornar imposições de medo. Normalizaremos crimes cometidos em segredo? Para que assim não seja, deveríamos orientar o exercício de advogar. Sejamos doutores em empatia, respeitosos por Excelência. Não aceitemos nenhuma injustiça por conveniência. Sabemos por experiência, o resultado justo da sentença, já é a recompensa.
Sentimento e imparcialidade são bases de equilíbrio e coragem para condução de nossa intuição. Quando dor e sensações não entram no jogo, perde-se também a humanidade. Perdemos todos. A Constituição foi culposamente estuprada, ou intencionalmente violada? Talvez nunca saibamos. Mas, podemos nos indignar. E o faremos. Ainda que palavras e posicionamento, continuem sendo tudo o que temos no momento.
Em outrora, ter sido a vítima, estuprada ou não? Perecemos do princípio da dúvida! Logo, se torna inquestionável o estupro doloso da vítima em audiência, cuja a autoria se atribui, ineditamente, ao tripé judiciário!
*Rebeca Moreno – Advogada