– “Nós, que sempre repudiamos as agressões contra a advocacia; que sempre condenamos o bisbilhotar das comunicações entre os advogados e seus clientes; nós, os advogados brasileiros, repelimos as tentativas de invasão da intimidade de um ministro do Supremo Tribunal Federal, grave atentado às liberdades públicas e à democracia.” O trecho é parte da manifestação de repúdio do Conselho Federal e o Colégio de Presidentes da OAB à instalação criminosa de escuta clandestina no gabinete do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal encontrada em varredura de rotina ali realizada. Ao manifestar sua solidariedade ao ministro, a OAB afirma que o ato gravíssimo é uma afronta às instituições, à Justiça e viola as prerrogativas dos magistrados. E lembra que a inviolabilidade das comunicações dos magistrados e de seu ambiente de trabalho é garantia da independência de seus julgamentos.
É preciso salientar não ter sido esta a primeira vez que um ministro da mais alta corte da nação é vítima de ataques da espionagem obviamente a serviço de alguém evidentemente temeroso em relação aos resultados da manifestação do magistrado. O criminoso em vias de ser condenado assume o risco e deixa clara sua opção pela criminalidade. São, claro, pessoas que se consideram acima das leis vigentes, inconformadas com as sucessivas demonstrações claras de que a lei vale efetivamente para todos no Brasil, como, aliás, a OAB se posicionou desde sempre. Vale lembrar não ter sido esta a primeira vez que um ministro do STF tem a inviolabilidade de seu gabinete devassada pela espionagem. Vale lembrar que o mesmo gabinete, que pertencia ao então presidente do STF, Joaquim Barbosa, foi alvo de espionagem e nada foi até hoje esclarecido.
O problema é tanto mais preocupante na medida em que o raciocínio lógico indica que se um ministro do Supremo pode ser vítima, o que se poderá dizer de um cidadão comum, ou um simples escritório de advocacia? “O abuso na utilização de novas tecnologias na interceptação de comunicações, é uma ameaça à atuação da advocacia e conseqüentemente um risco ao Estado de Direito.” A declaração, do presidente nacional da OAB, Claudio Lamachia, foi parte de seu discurso na sede da ONU, em Nova York, no encontro promovido pela União Internacional dos Advogados. Ele acrescentou que “quando pensamos em nossa atuação profissional como advogados, os riscos surgidos da espionagem ilegal e injustificada podem ter conseqüências dramáticas. O sigilo profissional é imprescindível para o adequado exercício da advocacia”.
Ele apontou para o risco de exageros na utilização das modernas tecnologias, “ainda que legalmente amparadas” – disse, para citar a filósofa Hannah Arendt, para quem até mesmo governos totalitários buscam suporte legal para suas medidas, isto é, buscam cobrir-se com a aura sagrada da lei escrita. A espionagem, assim como as bisbilhotices eletrônicas modernas representam, em verdade, mais um dramático sintoma da crise moral que se abateu sobre o Brasil, conforme registra nossa história recente. E a população precisa estar atenta, posto que qualquer um poderá ter sua vida devassada e a própria segurança comprometida. Não custa lembrar que a internet fornece uma ampla variedade de equipamentos e softwares até gratuitos para espionagem. E nesse sentido o crime organizado pode com certeza dispor de equipamentos altamente sofisticados. Alguém duvida?
Daí a necessidade de passar o país a limpo com um combate permanente à devassidão moral e decadência dos costumes que ameaça a liberdade de cada cidadão, posto que compromete a segurança individual, sem a qual não existe liberdade nem cidadania. É preciso haver mudanças. É preciso buscar o restabelecimento de parâmetros éticos, especialmente na política. E a oportunidade é agora, a partir das eleições municipais de outubro. Os candidatos devem ser cuidadosamente avaliados e os abusos denunciados para que possa haver punição rigorosa. O cidadão precisa estar atento pois que o crime organizado vai, com certeza, patrocinar a eleição de seus membros em busca do fortalecimento do poder político que – ninguém se iluda – já possui. É, portanto, fundamental a realização de uma varredura ética em todos os municípios brasileiros. Para que novos “grampos” não venham a ser instalados no cenário político nacional. E que os lá existentes comecem a ser mandados de volta ao lixo original.