“Em casa onde falta pão, todos brigam e ninguém tem razão” – diz o velho provérbio português, que pode ser adaptado para adequar sua aplicabilidade ao momento em que se acirram os ânimos em meio aos debates legislativos sobre as dez medidas contra a corrupção propostas pelo Ministério Público Federal. A racionalidade e bom senso parecem qualificativos que há algum tempo não assinam ponto em Brasília. O debate chegou a tal nível de precariedade lógica que o próprio procurador geral Rodrigo Janot chamou a atenção dos colegas, para recomendar “que todos concentrem esforços no seu trabalho de maneira objetiva e profissional, sem ideologia, e que toquem para frente todas suas investigações e seus processos. Essa é a resposta. A resposta tem que ser institucional e profissional. ”
Na verdade, a não ser pela inserção do projeto da Câmara, que define crime de responsabilidade para juízes e membros do MP, que pode ser corrigido na própria Câmara na segunda votação, o texto aprovado representa um avanço. Pode não ser o ideal, ou o que esperavam os procuradores, mas é o possível. E nada tem a ver com as modificações da lei nº 4.898, de 9 de dezembro de 1965, modificada em 2009, que agora o presidente do Senado se apressa a colocar em pauta. Importa mais que os debates sejam limitados ao âmbito do ambiente legislativo, com clareza, respeito institucional, equilíbrio, comedimento e, fundamentalmente, maturidade ética. Pode-se, afinal, criticar e até denunciar manobras de alguns políticos. Mas jamais a instituição. E a Ordem dos Advogados do Brasil está pronta e nacionalmente mobilizada para colaborar em todos os avanços que se possa conquistar para fortalecimento das instituições e do estado democrático de direito. Nosso partido, não custa repetir, é o Brasil. E nossa ideologia é a constituição.
Em exemplo claro de aprimoramento institucional foi a aprovação, por 285 votos a 72, do destaque do PMDB ao projeto de lei de medidas contra a corrupção (PL 4850/16) para incluir no texto emenda do deputado Carlos Marun (PMDB-MS) caracterizando como crime, por parte de juiz, promotor ou delegado, a violação de prerrogativa de advogado, com detenção de um a dois anos e multa. A emenda também especifica que, se a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) não concordar com o arquivamento de inquérito policial sobre esse crime ou o de exercício ilegal da advocacia, poderá assumir a titularidade da ação penal.
A aprovação foi comemorada pelo presidente nacional da Ordem, Cláudio Lamachia, ao lembrar que prerrogativas profissionais são as armas que o legislador outorga à advocacia para que possamos exercer nossa missão, que é de instrumentalizar o principal direito do cidadão, que é o direito de defesa. “De nada adiantaria o constituinte ter outorgado ao cidadão os direitos fundamentais, os direitos sociais, o direito às liberdades, à educação, à saúde, ao emprego, ou o legislador ordinário assegurar os direitos previstos no Código Civil, no Código do Consumidor, na CLT, se o cidadão não tiver meios de exercer esses direitos, papel exercido pela figura da advogada, do advogado, assegurado por nossas prerrogativas. É, assim, o direito de defesa, base do Estado de Direito. É importante lembrar que as ditaduras começam, no Brasil e no mundo, pelo ataque ao direito de defesa”.
“As prerrogativas da advocacia vêm sendo, há muito, vilipendiadas por autoridades no Brasil. Não importa a dimensão. Uma autoridade que impede um advogado de ter acesso aos autos de um inquérito, aquela que dá voz de prisão contra uma advogada por não se intimidar na defesa de um cidadão. Passamos momentos mais críticos, como da invasão de escritórios de advocacia com devassa nos nossos arquivos, em 2004. Mas ainda vivemos cenas como a prisão de uma advogada por ela ter protestado contra abordagem feita ao preposto de uma empresa cliente sua em pleno fórum de Carapicuíba, tendo saído de uma audiência e enquanto aguardava ser chamada para a audiência seguinte. A emenda aprovada vai, finalmente, corrigir isso” – disse o presidente da seccional paulista Marcos da Costa.