Com o intuito de contribuir para a solução da superlotação dos presídios brasileiros, o presidente em exercício do STF, ministro Lewandowski, apresentou ao ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, uma proposta de reforma do CPP.
A mudança na lei obriga os juízes a se manifestarem sobre a possibilidade de aplicação das medidas cautelares alternativas previstas no artigo 319 do CPP, antes de ser determinada a prisão em flagrante ou preventiva.
O texto altera os artigos 310 e 312 do CPP, prevendo que o juiz, ao se deparar com um auto de prisão em flagrante ou com um pedido de prisão preventiva, deverá primeiramente fundamentar o porquê de não aplicar ao caso as medidas cautelares previstas no artigo 319, como o uso de tornozeleira eletrônica, a prisão domiciliar, a suspensão de direitos ou a restrição de locomoção, dentre outras. Veja abaixo:
“Art. 310. Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentedamente:
I – relaxar a prisão ilegal; ou
II – aplicar quaisquer das medidas cautelares diversas da prisão previstas neste Código; ou (inciso acrescentado)
III – converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou (inciso remunerado)
IV – conceder liberdade provisória, com ou sem fiança. (Inciso remunerado)
§ 1º Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Decretp-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação. (Antigo parágrafo único)
§ 2ª A prisão preventiva somente poderá ser decretada como garantia de ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.
Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.
§ 1º A prisão preventiva somente será decretada se outras medidas cautelares revelarem-se insuficientes, ainda que aplicadas cumulativamente, devendo o juiz fundamentar a eventual ineficácia delas nos elementos do caso concreto. (Parágrafo acrescentado)
§ 2ª A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4º). (Antigo parágrafo único).”
Cultura do encarceramento
O ministro Lewandowski disse que a proposta tem como objetivo mudar o que ele chamou de “cultura do encarceramento” que existe no país. Segundo ele, qualquer pessoa detida, nos dias de hoje, fica presa por meses ou anos, sem maiores indagações, e sem que haja um exame mais apurado da sua situação concreta, explicou.
Cerca de 40% dos mais de 500 mil presos, no Brasil, são presos provisórios. “Isso, obviamente, contribui para a superlotação dos presídios”, disse o presidente em exercício do STF, que lembrou que existem outras propostas, não só legislativas como também administrativas, que deverão ser encaminhadas por um grupo de trabalho criado a partir da reunião da última quarta-feira, 29, “para, a médio prazo, podermos enfrentar com eficácia esse problema gritante que é o problema da superpopulação carcerária”, concluiu Lewandowski.
Medida extrema
O ministro da Justiça disse que, inicialmente, concorda com o “espírito” do projeto apresentado pelo chefe em exercício do Poder Judiciário. Embora o Congresso tenha aprovado uma lei dando alternativas ao magistrado (a alteração no artigo 319 do CPP) de aplicar medidas cautelares, “deixando a prisão como uma medida mais extrema – que deve ser aplicada, quando se configura necessária –, a prática judicial tem feito com que o caminho da prisão seja feito sem uma análise da possiblidade da aplicação de outras medidas cautelares”, afirmou.
Cardozo lembrou que a criação de um grupo de trabalho para tratar da questão de superpopulação carcerária, como discutido na reunião de quarta-feira, é algo que nunca se fez no Brasil, e que permitirá, pela primeira vez, enfrentar o tema como uma questão de Estado.
Veja a íntegra da proposta.