Confira artigo produzido pelo conselheiro federal da OAB que representa Rondônia, Elton Sadi Fülber, em que são pontuadas as mudanças previdenciárias previstas na MP 664/2014:
O Diário Oficial da União de 30.12.14 encerra algumas especulações sobre alterações previdenciárias e elenca algumas mudanças na Lei 8.213/91 que regula benefícios. Matéria seguirá agora para o Congresso Nacional a quem compete confirmar ou não as alterações no prazo de 120 dias.
O objetivo da legislação previdenciária sempre foi o de resguardar o trabalhador em um período futuro, quando, por motivos diversos, não pudesse mais desempenhar suas funções laborais normalmente.
Em 1888 temos no Brasil o nascituro de uma primeira legislação à cerca de matéria previdência, a qual regulamentava o direito de aposentadoria dos empregados dos CORREIOS. Porém, apenas em 1960 é que foi criada a Lei Orgânica de Previdência Social unificando as diversas legislações que regulavam os institutos de aposentadorias e pensões até então existentes.
Simultaneamente a inauguração da Previdência Social o governo brasileiro dá início à constituição patrimonial para, mais tarde, poder então arcar com os benefícios previdenciários do contribuinte beneficiário. No entanto, nos últimos 25(vinte e cinco) anos a previdência social se desfez do patrimônio adquirido, até porque os investimentos, em sua maior parte, eram de pouco ou nenhuma lucratividade e muitos deles exigiam recursos da previdência, a exemplo da manutenção de prédios comerciais e residenciais que integravam o patrimônio da previdência.
Estes equivocados investimentos, aliado ao festejado aumento da expectativa de vida do brasileiro, faz com que o déficit da previdência aumente a cada dia. Para equacionar este desequilíbrio o governo federal busca reformas pontuais, as quais sempre implicam, na sua maior parte, em perdas de direitos dos beneficiários, inclusive onerando ainda mais as empresas que contribuem com grande parte dos recursos administrados pela Previdência Social.
De plano podemos afirmar que são tímidas as alterações apresentadas pela MP 664/2014, não representando a reforma previdenciária almejada pela sociedade brasileira e necessária para a sobrevivência do instituto. Vejamos algumas alterações:
Auxílio doença – até o advento da MP 664/2014 a empresa pagava a remuneração do trabalhador enfermo nos primeiros 15(quinze) dias de sua incapacidade para o trabalho e, a partir daí, o segurado era encaminhado para a Previdência Social, a quem competia a remuneração até seu restabelecimento para o trabalho.
A nova legislação atribuiu à empresa o ônus de arcar com a remuneração de seu empregado até o trigésimo dia e, o Órgão Previdenciário passará a remunerar o trabalhador a partir do trigésimo primeiro dia ou a contar de seu requerimento, desde que dentro de um lapso temporal de 45(quarenta e cinco) dias.
Não há prejuízos ao segurado no tocante às alterações do auxílio doença apresentadas pela medida provisória, eis que a mudança diz respeito simplesmente a quem arca com o seu salário no período da convalescência. Nos parece que aqui o único objetivo foi de aliviar o encargo da Previdência Social e aumentar ainda mais o ônus das empresas na assistência de seus empregados.
Cada vez mais está se querendo desvincular o benefício do auxílio doença de uma incapacidade curta, momentânea, entendendo o governo de que, nestas hipóteses, caberia a empresa patrocinar os ganhos do trabalhador até seu restabelecimento.
Aposentadoria por invalidez – A partir de 01.03.15 entra em vigor um novo regramento à cerca da aposentadoria por invalidez, o que igualmente não representa prejuízos ao trabalhador beneficiário e, sim ao empregador.
O prazo inaugural do benefício sofreu alterações. Com a reforma legislativa contemplada na MP 664/2014, o benefício será concedido a partir do 31(trigésimo primeiro) dia, atribuindo às empresas, mesmo nas hipóteses de invalidez imediata, a remuneração dos primeiros 30(trinta) dias do labor, assim como ocorrerá nas hipóteses em que é devido o auxílio doença.
Pensão por Morte – Significativas alterações em prejuízo do segurado e de seus dependentes. Inicialmente podemos destacar à cerca da carência. Até o advento da MP 664/2014, os dependentes usufruíam do benefício previdenciário independente de carência.
Doravante temos a exigência de 24(vinte e quatro) meses de recolhimentos para a concessão da pensão por morte, destacando tão somente duas exceções:
A primeira diz respeito às hipóteses do segurado falecido estar em gozo de auxílio doença ou aposentadoria por invalidez e, segundo quando a morte decorreu de acidente de trabalho, seja ele típico, por equiparação ou no caso de doenças ocupacionais.
Nestas hipóteses então será concedido o benefício de pensão por morte independentemente de ser observada a carência de 24(vinte e quatro) meses consagrados agora pela nova legislação.
As novas regras para concessão de pensão por morte entram em vigor a partir de 01.03.15, segundo o que indica o artigo 5, III da MP 664/2014.
O motivo ensejador desta mudança diz respeito ao fato de que o beneficiário, prestes ao óbito, pudesse instituir filiações fraudulentas a fim de constituir o benefício a terceiros, gerando elevados custos ao órgão previdenciário.
Da mesma forma, justifica-se a reforma para evitar casamentos ou reconhecimentos de união estável, com a utilização de fraudes.
Com isso o cônjuge ou companheiro(a) para usufruir do benefício de pensão por morte terá que ter celebrado o casamento ou ter inaugurado a sua união estável há mais de 2(dois) anos da data do falecimento do beneficiário.
A exceção a esta regra ocorre quando:
“O óbito do segurado seja decorrente de acidente posterior ao casamento ou início da união estável; ou
O cônjuge ou companheiro for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividades remuneradas que lhe garanta subsistência, mediante exame médico-pericial a cargo do INSS, por doença ou acidente ocorrido após o casamento ou início da união estável e anterior ao óbito”.
A justificativa para a alteração legislativa restringe-se a coibir a celebração de casamentos fraudulentos ou termo inicial de união estável inexistente, inclusive as agora conhecidas homoafetivas, também contempladas na legislação previdenciária.
Os beneficiários devem atentar-se que estas modificações no tocante a carência entra em vigor no próximo dia 14 de janeiro de 2015, segundo a alteração que sofreu o parágrafo 2, do artigo 74 da Lei 8.213/91.
Outra alteração importante quanto a pensão por morte passa a vigorar em 01.03.15, quando o benefício não será mais pago na integralidade do ganho do segurado. Será devido um percentual de 50% do valor da aposentadoria que o segurado teria direito, com o acréscimo de cotas de 10% para cada dependente do falecido até o limite de 5(cinco), sempre assegurando um ganho de, no mínimo, um salário mínimo mensal para o benefício integral.
Exemplificando: se o segurado ou segurada quando de seu falecimento era casado(a) ou tinha uma companheira (o) e 3(três) filhos menores de 21(vinte e um) anos, nesta hipótese o total do benefício será de 90% do salário se na ativa ou da aposentadoria. Na medida que os filhos completem a maioridade, será excluída sua cota de 10%, o que vai acontecendo paulatinamente até que se restrinja o benefício ao cônjuge ou companheira(o) no percentual de 60%, considerando o acréscimo de 10% que também este tem direito.
Ademais, o benefício não será mais necessariamente vitalício como estabelecia a legislação anterior, eis que, se os dependentes, por ocasião do óbito do segurado, tiverem uma expectativa de vida superior a 35(trinta e cinco) anos, então a pensão por morte será temporária. A MP 664/2014 contempla uma tabela observando os dados do IBGE quanto a expectativa de vida do brasileiro.
Auxílio-Reclusão – O auxílio reclusão segue as mesmas regras da pensão por morte.
De forma que, a partir de 01.03.15 o valor do auxílio reclusão será de 50% do valor da aposentadoria que seria devido no caso de invalidez, também observando o regramento de cotas de 10% por cada dependente até no máximo de 5(cinco).
Como a MP 664/2014 alterou o artigo 26 da Lei 8.213/91, doravante será devido o auxílio-reclusão apenas nas hipóteses em que o segurado já alcançou a contribuição mínima em 24(vinte e quatro) meses).
Podemos dizer então que novamente o segurado terá prejuízos nas hipóteses em que busca o auxílio-reclusão, eis que agora terá que ser observado a carência de 24(vinte e quatro) meses de contribuição para poder fazer jus ao benefício.
Em conclusão podemos dizer que a MP 664/2014 objetiva tão somente desonerar, pelo menos de forma parcial, a Previdência Social de benefícios que há muito pagava aos segurados, ora transferindo para a empresa o ônus ou até mesmo buscando forma de se isentar da responsabilidade, o que decorre das hipóteses de exigência de carência.
O certo é que precisamos sim de uma reforma na legislação previdenciária mas, deve ser mais abrangente que as apresentadas na medida provisória publicada no final do ano de 2014.
Não se pode aumentar ainda mais a participação das empresas brasileiras no custeio dos benefícios previdenciários, sob pena de inviabilidade de sua competitividade, em especial no mercado cada vez mais globalizado que se acha instalado no cenário mundial.
De forma que, a necessária reforma não pode retirar benefícios dos trabalhadores e nem tampouco onerar ainda mais as empresas, como caminhou a MP 664/2014 e, não se diga ser isto impossível, até porque a Previdência pode ser viável mas deve ser tratada com responsabilidade. O órgão previdenciário não suporta pagamento de benefícios às pessoas que nunca contribuírem com seus cofres. O assistencialismo às pessoas que realmente precisam é possível mas, que não se faça com recursos da Previdência Social que deverá honrar obrigações tão somente em relação aos seus segurados.
Elton Sadi Fülber é Conselheiro Federal da OAB representando Rondônia e Professor Universitário.