Não há como evitar! A elevação da alíquota do ICMS, determinada pelo Governo do Estado como reação antecipada e “preventiva” aos imaginados efeitos deletérios da reforma tributária, vai alimentar a inflação e desabar pesadamente, como vergalho de três pontas, sobre o costado do mais pobre. Fora disso, todo o resto é especulação. A reforma orçamentária ainda tramita no Senado e, com certeza, volta profundamente alterada à Câmara, obrigada a nova rodada de discussões. Mas o aumento do ICMS começa a viger em janeiro e seus reflexos já integram a previsão orçamentária do governo de quase R$ 15 bilhões para 2024.
A medida fiscal não é exclusividade rondoniense. Mais 16 estados e o DF já recorreram a ela, segundo o Confaz. Argumentam buscar recuperação de perdas, mas o que visam é uma posição mais robusta na futura divisão do IVA pós reforma tributária. “Você é livre para fazer suas escolhas, mas é prisioneiro das consequências” – já advertia Neruda. As cabeças pensantes do governo certamente sabiam disso ao adotar a medida. O imposto, embutido dos produtos, será repassado ao consumidor final, assim como a perda do poder de compra dos salários com a inflação. Sem dinheiro, o público seleciona ainda mais o que (não) comprar, o que implica em redução das vendas no comércio, comprometimento da produção nas fábricas e menos arrecadação para os cofres públicos.
É o efeito cascata da exaustão tributária – ponto da curva a partir do qual o aumento de impostos produz revolta, insatisfação, desemprego, inflação, informalidade, sonegação. E zero receita! O ministro Gilmar Mendes já advertiu o governo sobre o risco em agosto de 2021. Felizmente o governo de Rondônia não se mostra insensível à avalanche de protestos desencadeada com a aprovação do reajuste. Especialmente a pronta resposta da OAB, que produziu, de imediato e com o apoio de 37 entidades representativas da sociedade civil e do setor produtivo, um grave manifesto contra a aprovação e sanção da Lei N° 5.629/23, especialmente pela meteórica tramitação. Para exigir a imediata revogação da lei.
Reuniões patrocinadas pelo governo no CPA, com 92 representantes do setor produtivo, sinalizaram com a perspectiva de redução da alíquota de 21%, segundo a Secretaria de Finanças. O secretário Luiz Fernando Pereira da Silva anunciou para esta semana o envio de uma nova proposta de reajuste à Assembleia. “Aceitável”, segundo ele, “pelo setor produtivo e suportável pelo governo, diante da sua necessidade de recomposição de receitas”. É óbvio que a discussão de tema tão controverso e a busca de consenso entre quem paga, quem recebe e quem está condenado a sentir os efeitos do vergalho – o cidadão rondoniense – deveria ter acontecido antes do envio da primeira mensagem à Assembleia. Mas conceda-se ao governo o benefício da boa vontade.
Mas em tal circunstância e independentemente no número estabelecido em tal “decisão consensual”, é certo que o aumento virá, qualquer que seja ele. E trará efeitos nefastos para a parte mais frágil do sistema, que é aquela que paga mais impostos. A economia não é um jogo de soma zero, no qual um dos participantes tem que perder para que o outro possa ganhar. O bolo das riquezas não é fixo, o que, pelo menos teoricamente, permitiria que todos os jogadores pudessem ganhar. A diferença, no caso do aumento de impostos, é que o governo aumenta a fatia do bolo que irá para seu prato. Daí que, não importa o quanto a riqueza possa crescer: os custos serão invariavelmente pagos justamente por aqueles aos quais são destinadas as menores parcelas.
*Andrey Cavalcante é ex-presidente e atual membro honorário vitalício da OAB Rondônia