“A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (…)” É o que diz o artigo 37 da Constituição, no qual se baseou o Tribunal de Contas da União para decidir, à unanimidade, pela submissão da OAB a seu controle de contas. É exatamente pelo que se pauta a OAB sem, contudo, qualquer submissão, vinculação ou comprometimento com qualquer dos poderes, pois a integralidade do que arrecada é de natureza privada. Há que se observar que, ao contestar decisão anterior e definitiva nesse sentido do Supremo Tribunal Federal, o TCU afronta o próprio texto legal ao qual acorre e se acode para “enquadrar” a Ordem. Ao contrário da OAB, a receita do TCU é exclusivamente originária do orçamento da União.
O Tribunal de Contas da União está, portanto, ele sim, obrigado a se pautar pelo que estabelece o artigo 37 da Constituição. Está comprometido, a buscar “eficiência” na condução de seu trabalho. Não se justifica, então, a mobilização de tempo e recursos humanos e materiais altamente dispendiosos, para discussão e votação em plenário de uma questão cujos resultados estão previamente pacificados por decisão do STF e por julgamento anterior do próprio TCU, agora atropelado. Aonde encontrar, então, “eficiência” em um julgamento estapafúrdio, irracional e desatinado a que foram conduzidos os ministros daquela corte?
“A decisão administrativa do Tribunal de Contas da União não se sobrepõe ao julgamento do Supremo Tribunal Federal. Na ADI 3026/DF, o plenário do STF afirmou que a Ordem dos Advogados do Brasil não integra a administração pública nem se sujeita ao controle dela. Não está, portanto, obrigada a ser submetida ao TCU” – observou, justificadamente indignado, o presidente nacional da OAB, Cláudio Lamachia. O próprio Ministério Público junto ao TCU já havia se manifestado nesse sentido, para advertir os ministros de que uma eventual decisão do órgão de contas no sentido de rever a matéria significa o descumprimento do julgado do STF.
Na verdade, apenas dois resultados seriam possíveis no lamentável julgamento: inútil ou inócuo. Se reconhecido o caráter jurídico da OAB como entidade prestadora de serviço público independente para classificá-la como categoria ímpar no elenco das personalidades jurídicas existentes no direito brasileiro. E assegurar sua autonomia e independência, sem qualquer violação do Artigo 37, Caput, da Constituição brasileira, seria rigorosamente inútil, por repetir integralmente o que fora antes decidido pelo Supremo. Ou inócuo, como foi afinal o resultado dessa tentativa de submeter a advocacia nacional e a própria cidadania ao atrelamento a uma instituição conceitualmente política, porque vinculada ao Poder Legislativo.
Na melhor das hipóteses é o TCU um órgão de extração constitucional, independente e autônomo, que auxilia o Congresso Nacional no exercício do controle externo. Alguns doutrinadores, juristas e professores de Direito Constitucional entendem, porém, que o artigo 71 da Constituição Federal coloca o Tribunal de Contas como órgão integrante do Poder Legislativo, já que a atribuição de fiscalizar faz parte das suas atribuições típicas. O certo é que a OAB, que não é órgão público, já investe recursos próprios em auditoria, controle e fiscalização, até porque é juridicamente incompatível investir recursos públicos, hoje tão escassos, para essa finalidade. A decisão do TCU não cassa decisão do STF, logo não possui validade constitucional.
O relator do processo no TCU, ministro Bruno Dantas, defendeu que a OAB seja “a primeira a servir de exemplo e apresentar uma gestão transparente”. É exatamente o que faz a Ordem, que é exemplo e modelo de gestão transparente. Desde sempre. E com recursos próprios – vale destacar – sem que, como imagina, tenha que se submeter ao controle público. Ademais, nem um mísero centavo dos recursos que administra tem origem de natureza tributária. A OAB Rondônia, por exemplo, se destaca pela administração transparente de sua execução financeira, sistematicamente demonstrada em seu portal na internet. Além disso, tem como norma o pedido de auditoria do Conselho Federal no fechamento de cada exercício financeiro. Daí considerar definitivamente afrontosa a decisão do TCU, que fere de morte a independência de que a OAB necessita para continuar a servir à sociedade. É, portanto, inadmissível que, seus dirigentes possam ser obrigados a qualquer comprometimento com instituições e poderes.