A Seccional Rondônia da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/RO), por meio da Comissão de Estudos Constitucionais, respondeu à consulta feita com relação à constitucionalidade da diferenciação dos indígenas quanto aos graus de “integração” e da obrigatoriedade do serviço militar para os indígenas, encaminhada pelo juiz eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral de Rondônia (TRE-RO), Delson Fernando Barcellos Xavier.
A questão originou-se com uma representação promovida pelo Ministério Público Eleitoral tendo como objeto revogar dispositivo do Provimento n. 02/2007, que “Aprova o Manual de Procedimentos dos Cartórios Eleitorais desta Circunscrição Eleitoral”, especificamente o item 24.29, que impôs aplicação aos indígenas integrados, do sexo masculino, as exigências legais para o alistamento eleitoral, atuada sob o número 3029.2014.622.0000 (TRE/RO).
No parecer, a Comissão de Estudos Constitucionais, através de seu presidente, Vinicius Valentin Raduan Miguel, arguiu-se que estaríamos diante de uma não recepção do Estatuto do Índio, que é de 1973, pela Lei Fundamental, de 1988, mormente no tocante aos princípios gerais da não discriminação e o princípio do reconhecimento da organização social dos indígenas.
Aduziu-se que há uma total desarmonia entre as normas constitucionais subsequentes e o Estatuto do Índio: inicialmente, a legislação infraconstitucional impunha uma noção de “integração”, descrita no art. 1º da lei, que nada mais era do que o forçado apagamento das culturas e práticas sociais indígenas, diante do novo primado constitucional e internacional de proteção e de respeito à diversidade étnica e organizacional, designado como o princípio da proteção da identidade (conforme Gilmar Mendes) ou da singularidade étnica (José Afonso da Silva).
Também, no opinativo jurídico, Vinicius Valentin Raduan Miguel indicou que a Constituição Federal fez uma opção pelo modelo democrático pluralista e representativo, como expressado no seu art. 1º, V. Assim, apoiando-se em Norberto Bobbio, apontou que “falar-se em democracia, acrescida da debatida regra do pluralismo, implica na política do reconhecimento da diversidade e nos arranjos institucionais necessários para viabilizar a não-exclusão e não segregação de grupos minoritários ou diversos em termos de identidade”.
Ainda, fundamentou-se que estaria violando a Convenção 169, da Organização Internacional do Trabalho, aprovada pelo Decreto Legislativo n. 143, de 20 de junho de 2002 e promulgada pelo Decreto n. 5.051, de 19 de abril de 2004. “Seria conceber um direito (de não servir obrigatoriamente) que é empregado para negar outro direito (aquele de candidatar-se e ser eleito)”, pontua Vinicius Miguel.
Em conclusão, a Comissão de Estudos Constitucionais aponta que a “diferenciação contida no Estatuto do Índio é inconstitucional, não tendo sido recepcionada pela CF/88, colidindo em razão da percepção etnocêntrica da primeira contra a noção multicultural e pluralista da última” e que a “diferenciação em graus de integração e, conjuntamente, a obrigatoriedade do serviço militar, violam frontalmente a Convenção 169, da OIT”, sendo, por isso, inconstitucionais.
Espera-se que o posicionamento da OAB/RO já encaminhado ao TRE/RO sirva para subsidiar o debate no âmbito da Corte Eleitoral.
O presidente da OAB/RO, Andrey Cavalcante, ressalta a Seccional tem atuado firmemente na defesa da Constituição e da Cidadania, lembrando as recentes atuações, com a interposição de medidas judiciais pelo direito dos advogados e das sociedades de advogados com registro na OAB/RO de não terem seu sigilo bancário quebrado diretamente pela Autoridade Fiscal, sem autorização judicial e as contribuições recentes da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB/RO, que foram importantes para a criação do Conselho Estadual de Defesa do Consumidor do Estado de Rondônia.
“Este é mais um caso de serviços prestados pela OAB/RO, por meio de suas Comissões, que estão se colocando em constante e diuturna luta pela democracia e pelo Estado de Direito”.
Confira abaixo, em anexo, o parecer na íntegra.