É muito interessante quando começamos a analisar o dia 8 de março, porque neste dia, muitas mulheres são acordadas com flores, frases bonitas e chocolates.
A verdade é que o dia 8 de março é marcante e nos oportuniza momentos de reflexão, porque podemos analisar de onde saímos e onde chegamos.
Identifico, que nós, mulheres e advogadas temos responsabilidades e já fazemos parte da história.
Embora tenhamos um avanço bem grande com relação as leis que tentam diminuir a paridade de gênero, o que ainda falta é o RESPEITO.
Infelizmente, ainda ecoa em meus ouvidos, a frase de um deputado votado por quase meio milhão de eleitores do estado de São Paulo, Artur do Val que vociferou: “Elas são fáceis, porque são pobres” (sim, ele objetificou nós mulheres ao falar daquelas em situação de vulnerabilidade na guerra da Ucrânia).
E aí começamos a pensar que há algo de errado com os nossos representantes.
Sabe o que é pior, a justificativa veio como já conhecemos de muitos que cometem o mesmo erro: foi uma brincadeira.
Há algo de errado com nossos representantes porque nós mulheres somos 56% do eleitorado no Brasil e temos uma representação no Congresso de apenas 15%. Mas aí, muitos podem perguntar, e se fosse o contrário? Mas o que incomoda não são os homens no poder, mas o desequilíbrio. Todos nós, mesmo com experiências distintas somos fundamentais e este é o ponto, e a realidade é inversa. Então a gente precisa falar para todos verem a realidade e debater sobre ela.
Eu sei que a palavra gênero, virou um tormento ou até chata para a maioria das pessoas com ideias conservadoras e por vezes fundamentalistas, por isso, precisamos encontrar caminhos para que homens e mulheres sejam, de fato, iguais em direitos e deveres, na medida das suas desigualdades.
Só que tudo isso que estou falando aqui não está só na política, mas no nosso dia a dia.
Quantas de nós mulheres advogadas ficamos constrangidas em ter que ir numa delegacia ou num presídio, ou no próprio fórum com medo de despachar sem ser assediada?
Quantas vezes não trocamos de roupas para se adequar ao formalismo da profissão ou imaginando no que os outros vão pensar?
Eu não precisaria estar falando disso se os números não me mostrassem essa realidade:
35% das advogadas brasileiras já foram discriminadas pelo seu gênero. 1 em cada três advogadas já foram assediadas sexualmente de acordo com dados da pesquisa global da IBA – Internacional Bar Association, ou seja, 1/3 delas já foram assediadas em fóruns, tribunais ou escritórios.
Logo, devemos pensar na luta por uma advocacia sem assedio que é de todos. Nos fóruns, tribunais e escritórios, o assédio moral e sexual ainda é uma realidade para advogadas de todo o Brasil. Uma realidade que, felizmente, somos capazes de transformar. Ainda bem que a OAB nacional lançou no último dia 08/03 uma campanha contra a violência moral e sexual que está sendo amplamente divulgada pelas Comissões das Mulheres Advogadas de todo território nacional.
Mas outro ponto importante que quero falar é sobre a noção de cuidado. Aqui faça uso das palavras da advogada Gabriela Prioli, que em um podcast “Por que temos que eleger e contratar mais mulheres?” disse:
Já pararam para pensar que a noção de cuidado é apenas feminina e isso restringe muito a possibilidade desta pessoa em outros campos. Ela não vai ter tempo ou espaço para buscar outras ambições, inclusive as profissionais. A compreensão de que a mulher tem que cuidar da criança é cultural, porque a única coisa que só a mulher biologicamente pode fazer é amamentar, o resto, os dois conseguem. Pai consegue dar comida, pai consegue dar banho, trocar a fralda, dar a medicação, pai consegue fazer tudo. E aqui temos que fazer uma distinção muito grande entre natureza e cultura para facilitar a compreensão desse tema. É da natureza feminina a menstruação, por exemplo, mas a mulher não nasce sendo responsável por todas as tarefas da casa. Esta parte é uma construção cultural. O sexo biológico é feminino, mas o gênero foi o conceito, o produto da realidade social e não somente em decorrência da anatomia dos corpos. Os homens precisam assumir mais funções dentro de casa. Até porque, os homens tem muito a contribuir.
E aí eu lembro que a licença paternidade é de somente 5 dias, remetendo a ideia de que o pai não precisa participar da primeira infância do filho.
Há pouco me vi estudando sobre o direito da advogada gestante quanto a suspensão de prazos. E gente, para uma advogada gestante e autônoma, que trabalha sozinha é bem complicado a licença maternidade viu. Para pedir a suspensão de prazo por 30 dias no processo, não basta eu apresentar a certidão de nascimento do meu filho, eu tenho que notificar o cliente. E aí, para nós que moramos no interior, que temos como maioria aqueles clientes que residem na zona rural, como faço para conseguir o ciente deste cliente? E ainda, a mesma legislação, não prevê a mesma suspensão de prazo, para o advogado que se torna pai, logo, ele não precisaria estar em casa, com sua esposa, assumindo sua responsabilidade paterna?
Senão for trabalho do homem cuidar dos filhos e da casa também, as mulheres nunca vão conseguir atingir todas as suas potencialidades em outras áreas e os homens vão perder o melhor da paternidade, isso sem contar com o interesse mais importante que é o da criança.
Pois é, será que realmente a lei está pensando em nós advogadas? Há muito a evoluir.
A verdade é que tudo isso nos mostra o quanto somos fortes e diferenciadas. Temos uma longa caminhada empunhando nossas bandeiras.
Por isso que o dia 08 de março nos permite refletir e agir em busca do empoderamento feminino, não podemos deixar que a síndrome do impostor nos impeça de chegar cada vez mais longe.
Feliz dia da mulher advogada para todas nós que lutamos diariamente pela igualdade, pela justiça e por um estado democrático de direito, mesmo diante de todas as dificuldades.
Quando uma mulher avança sem correntes, não são só as outras mulheres que avançam com ela não, mas o mundo que corre para uma direção bem melhor.