“O objetivo é adequar o estatuto às novas exigências do mercado e aos novos tempos, reforçando ainda as prerrogativas dos advogados para proteger a sociedade de eventuais ações arbitrárias do Estado”. Não poderia ser mais claro, em sua justificativa, o deputado Paulo Abi-Ackel, autor da lei 14.365, agora sancionado pelo presidente da República. A advocacia está de parabéns pela vitória agora consolidada, um trabalho que inaugura uma nova realidade para o direito à plena defesa de cada cidadão brasileiro. A lei altera o Estatuto da Advocacia – Lei nº 8.906/94, o Código de Processo Civil e o Código de Processo Penal. Reforça as prerrogativas da advocacia e impõe, de forma clara, o tratamento adequado à questão dos honorários advocatícios, como a definitiva e necessariamente esclarecedora vedação do aviltamento da sucumbência, além de limites ao impedimento à atuação da classe.
Embora, no entanto, abundem e remanesçam razões para comemorar, a sanção governamental confirma – vale lembrar – o que já dissemos aqui: “Isso está longe de indicar, porém, que a advocacia possa se dispersar em festejos e comemorações. Vigilate, et orate. Spiritus quidem promptus est, caro autem infirma – disse Mateus. É preciso estar atento, porque “O espírito está realmente disposto, mas a carne é fraca!”. Semelhante preocupação foi manifestada pelo próprio presidente da Ordem, Beto Simonetti, ao convocar para uma nova etapa da luta congressual pela derrubada dos vetos, especialmente aqueles relacionados à inviolabilidade dos escritórios de advocacia. Ele observou que é preciso manter os trechos que limitam ações de busca e apreensão nos locais de trabalho da classe, o que significa “assegurar a proteção ao Estado de Direito”.
Em igual sentido manifestou-se o procurador nacional de Defesa das Prerrogativas e Valorização da Advocacia, o conselheiro federal rondoniense Alex Sarkis: “A lei veio para dar um incremento ainda maior no campo da proteção do exercício profissional da advocacia. Apesar de termos as garantias muito claramente descritas no texto antigo, foi preciso esclarecer ainda mais alguns pontos para se evitar abusos e excessos praticados por várias autoridades, em especial as policiais. Trata-se de mais uma ferramenta de combate à tentativa de criminalização da advocacia”
O ex-presidente da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, que preside a Comissão de Estudos Constitucionais do CFOAB, também defendeu a continuidade da mobilização nacional, liderada pelo presidente Simonetti, na conjugação de esforços do Conselho Federal e do Colégio de Presidentes das subseções que resultou na aprovação do Congresso. Ele lembrou que “A lei cumpre a Constituição Federal quando estabelece que o advogado é indispensável é essencial à Justiça. Fortalecer o advogado é valorizar o cidadão”.
Apesar dos vetos, é plenamente justificável a comemoração das vitórias obtidas pela advocacia com a nova lei, classificada pelo presidente da OAB Rondônia, Márcio Nogueira, como “uma grande vitória de toda a sociedade brasileira”. De fato, em cada um dos pontos que interfere, a nova legislação revigora o instituto da plena defesa e oferece condições, inclusive remuneratórias, para o livre exercício profissional da advocacia.
A justificativa apresentada pelo presidente para vetar os trechos relacionados à inviolabilidade dos escritórios é fundamente frágil. Não se busca a blindagem da advocacia, mas o fortalecimento dos direitos do cidadão. Como haver plena defesa sem um ambiente de confiança entre o acusado e seu defensor? Ou sem a garantia de inviolabilidade daquilo que for discutido em tal circunstância? A rigorosa proteção às informações cobertas pelo sigilo profissional é do mais elevado interesse público. Nesse sentido, nada do que foi suprimido pelos vetos representa qualquer desrespeito às autoridades. Mas é preciso repudiar o autoritarismo.
A invasão do escritório é um inegável abuso. Pois que embute sempre o risco de espetacularização midiática, claramente engendrada para a criminalização da advocacia, fragilização da defesa e justiçamento do cidadão. Impõe danos irreparáveis à imagem pública do cidadão. No mais das vezes por objetivos eleitoreiros oportunistas, via ações investigativas incapazes e preguiçosas, o próprio Poder Judiciário é desrespeitado, transformado em mero instrumento privado de busca pelo poder político. Isso ficou claramente evidenciado pelo próprio STF, ao repudiar mais essa vergonhosa “página infeliz de nossa história”, com a devida licença de Chico Buarque, de cujo vaticínio também me aproprio: “Vai Passar!”
(*) Andrey Cavalcante é ex-presidente e membro honorário vitalício da OAB Rondônia